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ESG depende de padrões globais para avançar entre as corporações

De Administrador SH
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Maior desafio está na definição de parâmetros para a divulgação de dados, diz KPMG 

Um dos pilares da sustentabilidade corporativa é a transparência. A parametrização de indicadores e informações sobre questões ESG (social, ambiental e de governança corporativa) é, contudo, importante para as empresas avançarem no tema e organizarem a divulgação do que estão fazendo. Além de ser, claro, primordial para a boa governança. Com o avanço da discussão sobre padrões globais de contabilidade para práticas ESG, as empresas devem ser cada vez mais pressionadas para adotar, medir e divulgar suas estratégias, atividades, riscos e impactos socioambientais.

Em meados do mês de fevereiro, a IFRS Foundation, organização internacional que dita as normas para a divulgação de demonstrações financeiras usadas em diversos países, incluindo o Brasil, citou a pretensão de, nos próximos meses, divulgar os primeiros rascunhos das novas do IFRS ESG, que ditarão a divulgação de informações sobre os riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade das empresas. Isso depende de ter ao menos oito pessoas dos 14 membros previstos no conselho anunciado em novembro do ano passado durante a COP26 em Glasglow, o International Sustainability Standards Board (ISSB), responsável por dar a palavra final no assunto. Dois nomes já foram anunciados – o do presidente e vice do conselho – e a previsão é ter o quadro completo até o final de setembro.

“Há uma forte demanda das partes interessadas para que o ISSB publique os requisitos finais em tempo hábil com base no protótipo sobre clima e nos requisitos gerais de divulgação de sustentabilidade também publicados na COP26, sujeito ao processo adequado”, pontua o órgão (IFRS Foundation) na notícia.

Essa sinalização de urgência e a própria intenção da fundação de chegar a um consenso na parametrização dos dados ESG é vista com bons olhos por Sebastian Yoshizato Soares, sócio-líder de Governança da KPMG no Brasil e membro do Ibracon (Instituto de Auditoria Independente do Brasil). Em evento da Convenção dos Profissionais da Contabilidade do Estado de São Paulo (Convecon) recente, Soares pontuou que as novas normas podem aumentar a pressão não apenas para empresas de grande porte e exportadoras, mas também para as menores passarem a se preocupar com suas ações.

“É um ledo engano achar que os aspectos ESG só recaem sobre as grandes corporações. Cada vez mais as grandes organizações vão fazer pressão em toda a sua cadeia de suprimentos para que fornecedores também meçam e reportem essas informações. Elas vão querer saber qual o nível de aderência ESG para continuar a trabalhar com aquele fornecedor. Vai ser em graus de impacto diferentes, mas essa exigência vai atingir a todas as empresas”, afirma.

Hoje, algumas empresas já rastreiam práticas de sua cadeia, como as grandes do setor agropecuário e de papel e celulose, além de exportadoras que se deparam cada vez com mais restrições de acesso ao comércio internacional para quem não é sustentável. Cada vez mais elas serão cobradas para reportar essas informações, o que hoje é obrigatório apenas para as empresas de capital aberto ou que participam do sistema financeiro nacional.

Em setembro, o Banco Central impôs novas regras sobre riscos sociais, ambientais e climáticos para instituições financeiras, entre elas, a gestão e divulgação de informações sobre riscos e oportunidades relacionadas a ESG. Em dezembro, foi a vez da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) publicar uma nova instrução  (CVM 480) sobre o que precisa constar no formulário de referência das empresas de capital aberto, cobrando mais detalhes sobre práticas ESG interna e externamente.

Mas Soares acredita que isso vai avançar sobre outras companhias logo. Para o executivo, todas as empresas, independentemente do tamanho e setor, terão que, em breve, mensurar, analisar e reportar informações sobre sua atuação em prol da sustentabilidade e impacto socioambiental.

“Se eu tenho uma rede de supermercado no interior do Brasil com funcionários terceirizados, como segurança e profissional da limpeza, e algum deles eventualmente entrar em uma questão discriminatória, vou ter um problema na comunidade. Como você vai lidar? Se você não tem uma política de como lidar com questões raciais e outras formas de discriminatória, vou ter um problema na comunidade. Como você vai lidar? Se você não tem uma política de como lidar com questões raciais e outras formas de discriminação e não dar treinamento para toda a cadeia, corre o risco de ter problemas com a marca e reputação”, dá o exemplo para ilustrar que o tema independe de porte. “É preciso garantir que um nível mínimo de aderência para ESG meu fornecedor tenha”, completa.

Informações dispersas

O grande obstáculo hoje no avanço da temática ESG na contabilidade é a falta de parametrização. “Hoje diversas empresas fazem prestação de contas para seus stakeholders de formas diferentes e, acredito que elas vão convergir para um modelo único”, lembra.

Ele explica que, na prática, as empresas que buscam um diálogo e transparência nos assuntos ESG fazem isso por meio do relatório de sustentabilidade, que é voluntário. E cada uma se vale de uma parametrização que acha relevante – e às vezes mais de uma –, como a detalhada por Global Reporting Initiative (GRI), Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD), Climate Disclosure Standards Board (CDSB), Sustainability Accounting Standards Board (SASB) e International Integrated Reporting Council (IIRC).

Com isso, a confusão está posta para quem usa essas informações para tomar decisões de investimento, como investidores institucionais e estrangeiros, e negócios, como o próprio setor financeiro, que já exige algum grau de transparência com relação a riscos atrelados ao impacto socioambiental das companhias que buscam crédito.

Outro desafio das empresas na divulgação da agenda sustentável é a definição da matriz de materialidade, ferramenta usada pelas empresas para elencar as prioridades de diversas áreas dentro de ESG. Segundo Soares, é o casamento entre o propósito e impacto da empresa no mundo e onde precisa ser mais responsável.

“Existe um equívoco em achar que temos que endereçar todas as questões ambientais e sociais de uma vez. A jornada sustentável passa pela organização fazer uma revisitação no seu propósito; não o slogan comercial, mas o porquê de a empresa existir, qual problema da sociedade e planeta ela endereça. Uma vez revisitado e redefinido o propósito, a companhia precisa analisar sua estratégia de gestão e risco, incorporando aspectos ESG. Isso passa por definir itens materiais que vão ser olhados e cobrados, ou seja, a matriz de materialidade”, diz.

Para Renato Postal, moderador do painel da Convecon, sócio da PWC e membro do Risk & Quality Brasil no âmbito de IFRS, a padronização internacional vai facilitar a adaptação das empresas para uma realidade de mais transparência na temática sustentável. “O IFRS e o ISSB têm credibilidade e competência suficientes. O que não pode é ter um local com medida em metros, outro em pés e outro em milhas e tentar que sejam comparáveis. É importante ter alguém que faça um só parâmetro, que traga alinhamento de partida nessa área”, comenta.

A ideia do ISSB é justamente ser um aglutinador de iniciativas que hoje e propõe a parametrizar indicadores ESG. Por isso, a criação do conselho: espera-se chegar a um consenso. Por isso, a entidade contábil abriu o diálogo com organizações como CDSB, TCFD, Value Reporting Foundation (VRF), International Accounting Standards Board (IASB) e Fórum Econômico Mundial. A Organização Internacional das Comissões de Valores (Iosco), conhecida como CVM das CVMs, já endossou a medida e quer incentivar os membros se achar os futuros padrões práticos e eficazes.

A ideia do grupo é chegar a um “protótipo” de uma norma que deverá ser transformada, após consulta pública à comunidade de investidores, em definitiva até 2022 para todo mundo que adote o IFRS. É nisso que os membros que estão sendo anunciados este ano se debruçarão.

Postal afirma que, para a contabilidade, é uma mudança total no escopo de trabalho. “Quando abordamos ESG na contabilidade, não estamos falando de análise de dados históricos, mas divulgações sobre o futuro, previsões sobre riscos hipotéticos e mensuração disso tudo”, comenta. “O desafio é ter processos e controles que tragam informações suficientes e confiáveis para fazer o trabalho de divulgação e auditoria”, comenta.

Por isso, ele acredita que é preciso uma adaptação dos próprios contadores e auditores para não se tornarem obsoletos, e, eventualmente, parcerias com outros tipos de profissionais, especializados nos temas sociais e ambientais.

O recado dos dois profissionais para a audiência de contadores e auditores é direto: estudem o assunto se quiser continuarem profissionais relevantes nos próximos anos. “Tem que ter o mínimo de conhecimento para ter uma conversa de alto nível com o cliente. Assim como em 2010 tivemos que estudar sobre novas regulações do mercado financeiro, agora precisamos nos debruçar sobre o ESG”, diz Soares.

Fonte: Por Naiara Bertão, Valor

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