Leonardo Tonelo
Advogado especialista em operações de Mergers & Acquisitions (M&A) no varejo alimentar. Atua nas áreas de M&A, planejamento sucessório e governança familiar e corporativa para empresas familiares
O termo “M&A” é a uma abreviatura da expressão Mergers & Acquisitions que, em português, significa fusões e aquisições. Em sentido amplo, uma operação de M&A pode englobar qualquer forma de combinação de negócios entre empresas, em especial, a compra, a venda, a fusão e/ou a incorporação entre as envolvidas.
Abordaremos as operações de M&A sob o enfoque específico da compra e venda de empresas no varejo alimentar.
PRINCIPAIS FATORES QUE TÊM INFLUENCIADO OS EMPRESÁRIOS DO VAREJO ALIMENTAR A OPTAR POR OPERAÇÕES DE M&A
Nos últimos anos, a conjunção de fatores e de mudanças de cenários econômicos e sociais têm interferido bastante na operação das lojas de supermercados e, com isso, influenciado os empresários do varejo alimentar a olhar com maior atenção para as operações de M&A. De um lado, seja como alternativa de saída do negócio (no caso de grupos vendedores) ou, de outro, como alternativa mais eficiente de crescimento (exemplo de organizações que pretendem focar sua expansão).
Do ponto de vista dos grupos vendedores, o que temos verificado, com base nas operações que assessoramos nos últimos anos, é que os principais fatores, que têm levado o empresário ou família proprietária das lojas de supermercado a tomar a decisão de transicionar o negócio, são:
Dificuldades na sucessão: decorrentes de grande dificuldade do fundador em conseguir formar sucessores e engajar as próximas gerações da família, filhos e netos para dar continuidade à empresa familiar
Concorrência acirrada: advinda do rápido aumento da concorrência no varejo alimentar, por meio da abertura de inúmeras novas lojas em diversos formatos, como supermercados tradicionais, atacados, atacarejos, lojas de vizinhança, entre outros. Ou seja, o que se verificou, nesta década, é um aumento relevante na quantidade de novas lojas disputando o mesmo consumidor, considerando que a população das cidades não avança em igual proporção da abertura das novas unidades
Endividamento elevado e altas taxas de juros: um terceiro fator, que tem influenciado diretamente na decisão de alguns empresários do varejo alimentar a vender a sua loja ou rede, certamente envolve o elevado nível de endividamento de algumas companhias da área.
Constatamos em nossas conversas com os supermercadistas que algumas redes tradicionais do setor, que contrataram endividamentos e financiamentos para expansão e abertura de lojas em 2020 e 2021 a taxas de juros relativamente baixas à época, atualmente vêm sofrendo bastante para arcar com os compromissos assumidos. Isso porque essas dívidas, contratadas em sua maioria a juros pós-fixados, atualmente encontram-se num patamar de taxas extremamente altas e inviáveis para o setor supermercadista. E, assim, tornaram-se insustentáveis, forçando alguns empresários a vender o seu supermercado.
Opção de mudança de atividade para outras de menor risco: um quarto fato, que também tem influenciado a decisão de alguns empresários para saída do setor, considera a análise de risco versus o retorno do setor supermercadista. Explico: o empresário do setor de varejo de alimentos, tradicionalmente e em sua maioria, sempre teve o hábito de investir no setor imobiliário, em especial, na compra de imóveis para a construção de lojas próprias. E, em um cenário tão desafiador como o atual, alguns empresários têm feito a seguinte conta: se a operação de supermercado normalmente deixa um lucro líquido em torno de 2% a 3% na média e dividendos na ordem de 1,5%, faz mais sentido, financeiramente, vendê-la para um bom operador do setor (as operações de venda têm sido precificadas – em média – em torno de 30% do faturamento bruto anual). E se manter como dono dos imóveis dos estabelecimentos, alugando esses espaços por um valor que pode chegar a 1,5% do faturamento da loja. Ou seja, o empresário opta por sair do risco da operação. No fim do dia, continua tendo uma receita mensal praticamente igual àquela que possuía fazendo a gestão das unidades e correndo todo o risco da operação de lojas de supermercados.
Baixa concentração e consolidação do setor supermercadista: por fim, outro fator é a baixa concentração das redes de supermercados e a consolidação do setor via o expressivo aumento das operações de fusões e aquisições envolvendo lojas e redes.
Nesse cenário, o empresário tem aproveitado o momento de consolidação e a alta demanda por boas lojas para vender sua operação em um momento em que o setor está precificando relativamente bem as unidades e as redes de supermercados. O Ranking ABRAS 2024 demonstra que, não obstante as operações de M&A que têm ocorrido no setor, o índice de concentração das redes de supermercados ainda é muito baixo, se comparado aos números do varejo alimentar em outros países. Isso demonstra que ainda existe muito espaço para consolidação de redes por meio de M&A.
Já do ponto de vista dos grupos compradores, os principais fatores que têm levado os empresários do setor supermercadista, de pequeno, médio e grande porte a decidir pela expansão, por meio da aquisição de outras lojas e redes, estão demonstrados no quadro resumo.
PRINCIPAIS ERROS E ACERTOS EM OPERAÇÕES DE M&A NO VAREJO ALIMENTAR:
ERROS
Abaixo, listamos alguns dos principais fatores que têm evidenciado erros nas operações de M&A no varejo alimentar:
FALTA DE CLAREZA NA ESTRATÉGIA
Erro: muitas empresas, que iniciam processos de M&A sem uma estratégia clara e bem-definida, podem ter como resultado aquisições que não agregam valor ou não se alinham aos objetivos de longo prazo
Consequência: aquisições mal direcionadas que aumentam a complexidade operacional sem os devidos retornos financeiros
AVALIAÇÃO IMPRÓPRIA
Erro: subestimar ou superestimar o valor da empresa-alvo não considerando todos os aspectos financeiros, legais e operacionais
Consequência: leva a sobrepreço ou perda de boas oportunidades de negócio
DUE DILIGENCE SUPERFICIAL
Erro: não realizar uma due diligence completa, ignorando riscos legais, fiscais, ambientais e culturais
Consequência: problemas inesperados pós-aquisição que podem ser caros para resolver
ERRO NO FOCO DAS SINERGIAS
Erro: apostar demais em sinergias projetadas, sem ter um plano detalhado de como alcançá-las
Consequência: metas de sinergia que não são alcançadas, resultando em desilusão e perdas financeiras
RESISTÊNCIAS E CHOQUES CULTURAIS
Erro: ignorar diferenças culturais entre as organizações, o que pode minar a integração
Consequência: conflitos internos, alta rotatividade de funcionários e desmotivação
FALHAS NA INTEGRAÇÃO
Erro: não planejar adequadamente a integração pós-aquisição, subestimando os desafios associados. Fala-se muito sobre o choque e a interposição de culturas, as instalações e as funções no
momento de uma fusão ou aquisição.
Mas uma das maiores barreiras enfrentadas tem sido a integração de dados
Consequência: integrações malsucedidas podem aumentar consideravelmente o período de integração dos sistemas do comprador e vendedor, o que pode prejudicar a operação de M&A
ACERTOS
Abaixo, listamos alguns dos principais fatores que têm evidenciado acertos nas operações de M&A no varejo alimentar:
ALINHAMENTO ESTRATÉGICO CLARO
Acerto: estabelecer metas claras e estratégicas para a aquisição, vinculando-a diretamente aos objetivos de longo prazo da empresa
Resultado: maior probabilidade de que a aquisição complementará as capacidades da empresa
AVALIAÇÃO RIGOROSA
Acerto: realizar uma avaliação financeira detalhada e realista, usando métodos comprovados e revisões independentes com o auxílio de assessores especializados no varejo alimentar
Resultado: aquisições a preços justos que maximizam o retorno sobre o investimento
DUE DILIGENCE DETALHADA
Acerto: conduzir um exame abrangente da empresa–alvo, envolvendo diversos especialistas do setor supermercadista para identificar riscos potenciais e efetivos
Resultado: minimização de surpresas negativas, permitindo um planejamento mais eficaz da operação de M&A
PLANEJAMENTO REALISTA DE SINERGIAS
Acerto: projetar sinergias realistas com planos claros para alcançá-las, incluindo o cronograma e responsáveis
específicos
Resultado: metas de sinergia realistas reduzem a desilusão e aumentam a confiança dos stakeholders (todos os terceiros que se relacionam com a empresa compradora e a adquirida)
VALORIZAÇÃO DA CULTURA ORGANIZACIONAL
Acerto: realizar uma análise cultural detalhada e desenvolver estratégias para facilitar a integração
Resultado: transição mais harmoniosa que retém talentos e preserva o moral da equipe
PROGRAMAS DE INTEGRAÇÃO BEM-DEFINIDOS
Acerto: desenvolver um plano de integração detalhado antes da conclusão da aquisição, incluindo alocação de recursos e responsabilidades claras
Resultado: integração mais rápida e eficiente que maximiza o valor da aquisição e o retorno do investimento.
PRINCIPAIS ETAPAS DAS OPERAÇÕES DE M&A NO VAREJO DE ALIMENTOS
O quadro acima, que traz um resumo, demonstra quais são as principais etapas de uma operação de M&A no varejo de alimentos:
CONCLUSÃO
Portanto, em resumo, se por um lado existe bastante insegurança e desafios para o setor supermercadista nos próximos anos; por outro, continuará a existir oportunidades muito interessantes para aqueles empresários que estão expandindo ou pretendem fazer isso por meio de aquisição de outras lojas e redes.
Na avaliação da Varejo Connect, que tem participado de algumas das mais relevantes operações de expansão via aquisição de outras lojas e redes no Estado de São Paulo, esse momento de consolidação do setor deverá perdurar por, pelo menos, os próximos cinco anos.