Líder global de varejo da McKinsey mostra que definir uma proposta de valor consistente é essencial para diferenciar seu supermercado da concorrência
Por Renato Müller
O Brasil é um dos países com varejo supermercadista menos consolidado do mundo. Segundo dados do Ranking Abras, as mil maiores redes do país respondem por 70% do faturamento total do setor – no Chile, as top 3 supermercadistas somam essa participação de mercado. Em um ambiente tão fragmentado, encontrar um diferencial relevante em relação à concorrência pode fazer toda a diferença entre o sucesso e ficar pelo caminho.
Para Steven Begley, líder global de varejo da consultoria McKinsey, em mercados menos consolidados, como o brasileiro, é ainda mais importante ter uma proposta de valor muito consistente. “O Brasil é um mercado muito dinâmico, em que a digitalização avançou bastante, existe uma grande preocupação dos clientes em manter seu poder de compra e a experiência de compra tem uma importância enorme. Quem consegue atender às necessidades e desejos dos clientes salta à frente dos concorrentes”, explica.
Segundo o executivo, palestrante internacional da ABRAS’23, que acontece nesta semana em Campinas (SP), globalmente 5 grandes temas estão dominando o cenário do varejo de alimentos: a recuperação do otimismo, o aumento do consumo alavancado pela indulgência, o aumento do interesse por atributos saudáveis, uma pressão contínua sobre a rentabilidade e a expansão do omnichannel. “Neste ambiente não é fácil ser vencedor, mas é ainda mais difícil permanecer vencendo. É preciso acompanhar o comportamento dos clientes e ter uma proposta de valor muito sólida, que traga diferenciação”, analisa Begley.
Na avaliação do consultor, a pior estratégia é tentar ser tudo para todos. “Quem tenta ser tudo acaba sendo genérico e não se diferencia. Empresas que fazem escolhas e definem um ou dois atributos-chave em que são excelentes tendem a ter um melhor desempenho, pois conseguem ter um posicionamento claro para o consumidor”, explica. Para Begley, os supermercados precisam focar em um ou dois destes atributos:
- Valor: está ligado à percepção de preços baixos, o que não necessariamente significa ter sempre ofertas matadoras. “Valor está mais ligado à ideia de que o consumidor encontra o melhor produto por preços justos, o que pode ser impulsionado tanto pelo desenvolvimento de marcas próprias como por promoções em categorias relevantes e preços sempre competitivos em produtos essenciais”, analisa Begley.
- Sortimento: o supermercado precisa funcionar como um curador de produtos, ajudando o consumidor a ganhar tempo em suas escolhas. “O sortimento também comunica posicionamento, seja pelo tipo de produto, seja pela exclusividade no fornecimento. Por isso, é um fator estratégico de diferenciação”, diz o executivo.
- Experiência: a personalização do relacionamento com os consumidores e a criação de um ambiente que traz bem-estar para o público amplia o engajamento. “A questão é que experiência significa uma coisa diferente para cada cliente. Só quem conhece o consumidor e analisa seus dados consegue entender o que faz diferença para o seu público”, alerta Begley.
- Serviços: oferecer serviços extras aumenta o share of wallet do supermercado e tem um impacto positivo sobre os resultados do negócio. De clínicas odontológicas a serviços financeiros, passando por restaurantes, lavanderias e óticas, existem inúmeras possibilidades. “A oferta de serviços agrega valor, traz diferenciação e transforma os ativos do varejista. Especialmente em um setor de margens tão apertadas como os supermercados, é um caminho de grande potencial – desde que tenha afinidade com o que o consumidor entende como importante”, recomenda.
- Conveniência: economizar tempo é uma demanda importante dos clientes – e uma oportunidade para os supermercados. “As empresas que simplificam o dia dos consumidores e oferecem agilidade têm um diferencial importante”, analisa Begley. A conveniência pode ser traduzida no dia a dia do supermercado em acessibilidade (facilidade de entrar e sair da loja, um layout prático para a loja e boa alocação dos produtos no PDV), pagamentos (velocidade, variedade de opções e simplicidade de uso) e omnichannel (incluindo a integração aos programas de fidelidade).
Mas antes, conheça o cliente
Ter uma proposta de valor sólida, baseada em um ou dois atributos, é essencial, mas decidir que caminho tomar depende daquilo que é importante para o consumidor. “O supermercado precisa definir sua proposta de valor com base no que é importante para seus clientes e em suas necessidades não atendidas. É o foco no consumidor que define o campo de jogo e a maneira como o negócio pode se diferenciar dos concorrentes”, explica Begley.
Segundo o executivo, um erro comum é definir o foco da proposta de valor sem levar em conta o que é mais relevante para o consumidor. “Faça pesquisas de mercado, entenda a atuação do seu negócio hoje, reconheça as demandas ainda não atendidas e, a partir daí, tome as decisões estratégicas”, recomenda.
Nesse processo, vale um alerta: garanta que as lojas físicas e a operação digital tenham a mesma proposta de valor. “É preciso ser consistente. A proposta de valor tem que ser a mesma, ainda que ela se apresente de formas diferentes nos diversos canais. O sortimento, por exemplo, pode trazer produtos diferentes no site e na loja física, mas eles precisam atender aos mesmos objetivos estratégicos e ter o mesmo posicionamento”, exemplifica.
Além disso, é preciso estar atento às pessoas. “O varejo é um negócio de pessoas. Por isso, capacite sua equipe para entregar para o consumidor a proposta de valor. Invista no treinamento do seu time, pois as pessoas fazem toda a diferença para conquistar os clientes”, completa Begley.