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Brasileiro troca almoço por lanche

De Administrador SH
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Indústria reajusta produtos e clientes reduzem quantidade de itens no carrinho

Em um cenário de alta de preços, os brasileiros reduziram a quantidade de produtos consumidos. O valor desembolsado com uma cesta de 120 categorias de itens, entre alimentos, bebidas, limpeza doméstica e higiene e beleza, avançou 13,1% no primeiro trimestre de 2022, ante igual período de 2021. Mas na quantidade de produtos houve recuo de 5%.

Os dados são de um estudo da consultoria Kantar, antecipado com exclusividade pelo periódico. Quando se considera o preço médio por unidades (cada produto ou embalagem), a alta foi de 13,7%.

Os dados do relatório “Consumer Insights 2022” mostram mudanças de hábitos também nos gastos fora de casa. Neste caso, o preço médio por produto cresceu 11%, acompanhado por um recuo de 10% na quantidade consumida. O valor, no entanto, se manteve estável.

“Este primeiro trimestre de 2022 é um primeiro início de retomada de normalidade em termos de consumo por causa da situação da pandemia. E o que se vê é um conjunto de dois efeitos: aumento de preços, especialmente de alimentos, e bolso mais apertado do consumidor. E isso afeta todas as classes de renda, embora as mais baixas sejam mais prejudicadas, e todas as regiões. O consumidor acaba reduzindo o número de unidades compradas, não consegue acompanhar a alta da inflação”, explica a diretora comercial da Kantar, Raquel Ferreira.

A pesquisa traz o cenário para diferentes regiões no país. A consultoria usa um conjunto de sete regiões, que permite avaliar o desempenho no interior e nas regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro.

Preço da refeição fora de casa sobe 21% e consumidor opta por ‘snack’, que ficou 11% mais caro, diz a Kantar

Todas as sete regiões pesquisadas tiveram alta de dois dígitos no preço médio por produto no primeiro trimestre de 2022, ante igual período de 2021.

As altas mais expressivas foram no Centro-Oeste (16,4%), na Grande São Paulo (15,6%) e no grupo que reúne Norte mais Nordeste (15,3%). Se no Centro-Oeste o número de unidades vendidas cresce (1,6%), na Grande São Paulo houve queda de 3%, acompanhada de recuo de 5,4% no Grande Rio, onde o preço médio por unidade subiu 14,4%. No Norte e Nordeste, há estabilidade nas quantidades vendidas.

“O Norte e Nordeste têm uma estabilidade no consumo, um efeito muito claro da redução do subsídio governamental. Era uma região que vinha sustentando o consumo, quando o alcance do auxílio diminuiu, isso impactou bastante o que vai para as mesas”, explica Ferreira.

Um outro olhar sobre a redução do consumo pode ser verificado no indicador que acompanha o número médio de itens incluídos pelo consumidor no carrinho de supermercado a cada vez que vai às compras. Na média nacional, o brasileiro comprava 13 itens a cada visita ao supermercado no primeiro trimestre deste ano – no primeiro trimestre do ano passado eram 15 produtos.

Seis das sete regiões brasileiras analisadas pela Kantar tiveram queda na quantidade de produtos incluídos no carrinho: apenas no Grande Rio o número se manteve estável em 11. Os consumidores do Nordeste diminuíram de 19 itens no primeiro trimestre de 2021 para 14 no primeiro trimestre de 2022.

No consumo fora de casa, o relatório da Kantar também mostra a mudança do perfil de compras: o consumidor tem negligenciado as refeições completas, que ficaram 21% mais caras principalmente na hora do almoço, com um tíquete médio de R$ 43,94, e dado preferência a petiscos (“snacks”), que ficaram 11% mais caros e ainda assim têm valor correspondente a um quarto da refeição (R$ 10,43).

Os dados apontam que a frequência de refeições caiu 25% no primeiro trimestre de 2022, frente ao primeiro trimestre de 2020, enquanto na categoria “snacks” essa queda foi menor, de 9,8%.

“O grande ponto de atenção é que o início de retomada em 2022 ainda não permite que o ritmo seja o que era antes. Tem duas coisas: as pessoas que foram se habituando a rotinas diferentes e uma pressão no bolso que faz com que, mesmo que as pessoas façam refeições fora de casa, essa refeição diminuiu também para as opções mais econômicas”, nota Raquel Ferreira.

A inflação é uma das principais preocupações das lideranças empresariais do país, como mostrou, na semana passada, reportagem sobre a premiação “Executivo de Valor”, que reconhece os melhores gestores de companhias brasileiras. O cenário da inflação continua incerto. As recentes desonerações tributárias podem ajudar a reduzir a inflação neste ano, mas em 2023 o quadro fiscal deve pressionar a inflação para cima.

O Bradesco, por exemplo, reduziu a projeção do índice oficial da inflação (IPCA) de 9% para 7,5% este ano e elevou a expectativa para 2023, de 4,1% para 4,9%.

Procuradas para comentar sobre o efeito da inflação nas vendas, muitas redes de supermercados preferiram não falar sobre o tema. Entre as que se pronunciaram, não se admitiu que haja redução na quantidade de compras pelos clientes, mas a busca de marcas com preços menores foi ressaltada como um comportamento dos consumidores neste momento.

“A redução de itens não [foi percebida], mas percebemos sim uma movimentação de troca de marcas. Uma parte dos consumidores está mais aberta a experimentar marcas alternativas. Mas é uma movimentação sempre baseada na qualidade e no custo versus benefício”, diz Manuel Pinheiro, diretor comercial do Supermercados Mundial, rede com 20 lojas no Estado do Rio de Janeiro com foco em descontos e promoções relâmpago nas lojas.

Ele afirma que a rede – que já trabalha com marcas alternativas além das chamadas grandes marcas do mercado – também tem investido no que chama de desenvolvimento de novas categorias de produtos.

Um exemplo citado por ele é o da linguiça de frango, produto no qual foi feita uma aposta, com aumento de exposições nas lojas e anúncio em televisão. O preço do quilo é menor que o do filé de frango, um dos itens que tiveram alta recente de preços. O volume de vendas mensal da linguiça de frango, que era de 500 quilos, passou para mais de 50 toneladas. “Queremos oferecer opções ao consumidor para que a cesta de compras continue farta”, afirma Pinheiro.

A Rede Supermarket, com mis de 120 lojas no Estado do Rio, informou que tem investido na busca por novas marcas para oferecer ao consumidor, que unam qualidade e preço baixo. De olho no cenário atual, tem planejado um ciclo de promoções para o fim do mês. O objetivo, segundo o presidente, Paulo Bonifácio, é “ajudar o consumidor que já está com o salário chegando ao fim”.

Consumidor pesquisa mais, corta supérfluos e compra menos produtos

Das famílias aos pequenos negócios: as compras nos supermercados precisaram de adaptações para dar conta dos preços mais altos. Redução de quantidade, mudança de marcas, pesquisa de ofertas e suspensão da compra de algum produto são as principais estratégias citadas para lidar com o impacto da inflação no orçamento.

Para dar prioridade a frutas e legumes para o filho Gael, de um ano, Bianca Kelly Gonzaga Pereira, de 26 anos, tem deixado fora do carrinho do supermercado proteínas mais caras como a carne e supérfluos que costumava comprar antes, como biscoitos e doces. Com os R$ 300 que fazia as compras para o mês há alguns meses, agora só consegue abastecer a casa por no máximo duas semanas.

“Somos três pessoas em casa, contando também meu marido. Com o que gastava para o mês, agora só dura, no máximo, duas semanas. A gente tem comido mais ovo e linguiça, a carne ficou muito cara nem dá para pensar. Deixei as besteiras de lado e pesquiso bem mais os preços atrás de promoções, vou comprando aos poucos”, conta.

Saídas para comer fora ou pedidos de comida por “delivery” foram hábitos abandonados pela família; “A gente saía para comer ou pedia [pelo] iFood. Agora, um hambúrguer dá R$ 40. A gente teve que cortar esse lazer, não dá para arcar com um gasto desse”, diz.

A aposentada Jerusa Maria Alves Prado, de 73 anos, também tem na ponta na língua a a diferença no preço de suas compras. Com uma nota fiscal de R$ 418 do supermercado na mão, diz que o gasto não saía por mais de R$ 200 há alguns meses: “Tudo aumentou. Feijão, manteiga, açúcar, carne, frutas, queijo… Material de limpeza está uma fortuna”, afirma.

Mesmo as marcas que costumavam ser mais em conta tiveram alta de preço, nota ela, e está difícil fazer substituições de marcas. “Com esses preços, a gente acaba ficando mais nos produtos básicos”, diz.

A redução de quantidades foi a alternativa encontrada pelo aposentado José Monte Novo, de 79 anos, para fazer as compras continuarem cabendo no seu orçamento. A cada ida ao supermercado, diz, é um susto.

“Cada dia pensa uma coisa de preço e é outra. Toda vez é um susto. Não tem outro jeito. O que eu levava cinco [unidades], levo dois. O que eu comprava dois, agora não compro nenhum”, diz. Por uma compra de apenas cinco itens, pagou R$ 47. Na sacola, apenas pão (dois tipos), queijo, melancia e laranjas.

Fundador de uma empresa que hoje fornece cerca de 200 refeições por dia, Bruno Braga Miquelino, de 45 anos, sai todo dia em sua bicicleta percorrendo supermercados atrás de promoções para garantir o preço mais baixo possível para os insumos. Embora também tenha fornecedores, diz que a pesquisa é fundamental para garantir as ofertas que vão ajudar a melhorar sua margem de lucro afetada pela inflação.

“Os preços aumentaram muito. Um quilo de frango, que há uns meses saía por R$ 12, agora está mais de R$ 20. A gente tem que ir onde está mais barato, tudo para amenizar essa inflação”, diz ele, conhecido como “Bruno Mineiro”, já que é natural de Peçanha (MG).

A pesquisa é ainda mais necessária, segundo ele, porque não consegue repassar grande parte do aumento de seu custo para o preço das refeições. O prato de frango à parmegiana, por exemplo, que custava R$ 20, aumentou para R$ 22. Esse aumento de 10%, no entanto, conta, ficou muito abaixo do que foi a alta do seu custo.

“Mesmo repassando só uma parte tem gente que reclama. Por isso a gente precisa pesquisar muita promoção, para segurar um pouco a perda da margem”, afirma.

Além das pesquisas permanentes de preços de insumos, Miquelino lançou recentemente refeições em embalagens menores, de 350 gramas, e também opções de caldos e sopas. Se o preço médio das refeições fica em torno de R$ 20, esses novos produtos têm preços mais perto dos R$ 15.

Fonte: Por Lucianne Carneiro, Valor

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