Por Redação SuperHiper
O Brasil vive uma grave contradição social e econômica: enquanto milhões de pessoas enfrentam a fome e convivem com algum grau de insegurança alimentar, o desperdício de alimentos no País alcança montantes gigantescos. Uma das causas é o atual modelo que impede a comercialização e o consumo após o prazo de validade.
Essa rigidez conduz ao descarte de alimentos ainda seguros e adequados, gerando impactos negativos, não apenas para as famílias brasileiras, mas para o meio ambiente e para a economia.
Diante disso, o 5º Fórum da Cadeia Nacional de Abastecimento (FCNA) ABRAS realizado em 10 de junho, em Brasília, discutiu o conceito de “best before” e os ganhos do modelo, já adotado nos Estados Unidos e na Europa, para todos: produtores, varejistas, consumidores e meio ambiente. Isso porque ele amplia a razão social de alimentos, sem comprometer sua segurança.
Participaram do debate: o senador Efraim Filho (União-PB); os deputados federais: Luiz Gastão (PSDB-CE) e Zé Neto (PT-BA); o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), João Dornellas; e o CEO da Food To Save, Lucas Infante.
O hoje e suas consequências
O modelo atual de validade não faz distinções sobre categorias de alimentos (por exemplo perecíveis e não perecíveis) e tem como base as chamadas características organoléticas, ou seja, os atributos percebidos pelos sentidos humanos, como aroma, sabor, crocância, cor, textura e forma, em seu grau de integridade máxima.
Dessa forma, o conceito de “até a data atual de validade” funciona para o caso de o consumidor desejar consumir o produto com todas estas características íntegras, mas, os atributos de valor nutricional e, principalmente, de segurança para o consumo, continuam preservados por muito mais tempo.
As consequências? Em razão da obrigatoriedade do descarte, o Brasil desperdiça cerca de 27 milhões de toneladas de alimentos por ano. Atualmente, os produtos são descartados pela indústria, pelo varejo e pelo consumidor, obedecendo a legislação em vigor, sem distinção sobre a diferença dentre as categorias, em relação à qualidade e à segurança, significando apenas no varejo alimentar um desperdício da ordem de R$ 4,3 bilhões anuais.
O amanhã e seus benefícios
A proposta do FCNA prevê que os alimentos não perecíveis recebam no rótulo de validade a marcação: “consumir preferencialmente até” no lugar do atual “até”. Assim, os produtos poderão ser vendidos e consumidos, após a data desde que respeitadas regras de conservação.
Resumindo: a partir da adoção do “best before”, caberá ao consumidor decidir sobre comprar e consumir produtos perenes e estáveis, desde que mantidos em condições adequadas de conservação, reduzindo o desperdício.
Em Portugal e na Dinamarca, peças publicitárias sobre o “best before” são muito claras e informativas. No caso do país lusitano, ela se baseia no conceito: “saber a diferença, faz a diferença”. E no país nórdico, as diretrizes são claras: “look, smell, taste and don’t waste”, ou seja: “olhe, cheire, prove e não desperdice”.
Destaques dos debates
“Esse tema tem um impacto social profundo, porém tem sido muito mal compreendido. A chave, então, está na comunicação. Pelo modelo atual, muita comida boa e com condição de ser consumida, vai para o lixo. Em casa, cada família desperdiça 130 quilos de comida por ano só porque a data de validade venceu. Sem contar que no Brasil nem todo mundo tem disponibilidade de alimentos na medida e na quantidade ideal. E um ponto muito importante: estamos falando aqui de adotar o ‘best before‘ apenas para alimentos não perecíveis”, disse o presidente da Abia, João Dornellas.
“O grande desafio é disseminar informação, isto é, reeducar a sociedade brasileira para um consumo mais responsável e consciente conectando indústria, varejo e sociedade. Assim, há quatro anos, fazemos isso com a ajuda da tecnologia por meio das nossas sacolas surpresa”, afirmou o CEO da Food To Save, Lucas Infante.
“Com esse modelo do ‘best before’ eu não tenho dúvida que esses alimentos poderão ser vendidos com preços diferenciados beneficiando os consumidores que terão acesso a itens mais baratos, com os mesmos nutrientes”, disse o deputado federal Luiz Gastão (PSDB-CE).
“Fazer um projeto de lei é um desafio, mas plausível. O que realmente será importante e mais difícil é mudar a cultura, ou seja, modificar o homem. Quando nos debruçamos nos argumentos é absolutamente irracional o modelo que existe hoje começando pelo desperdício, e passando pela inacessibilidade de familiais mais humildes a itens, que teriam descontos com o conceito ‘best before’, e pelo setor produtivo de quem produz, paga imposto e é obrigado a desperdiçar”, afirmou o senador Efraim Filho (União-PB).
“Diante de todos esses dados sobre o desperdício, entre os que mais me chamaram a atenção estão os que mostram que 68% das condições que levam os produtos a ficar fora de consumo e, consequentemente, ao descarte acontecem dentro de casa. No varejo, o índice é de 13%”, disse o deputado federal, Zé Neto (PT-BA).