Não há mandato oficial, mas balão de ensaio: banco busca outros interessados para eventual transação conjunta
Sadia de um lado, Perdigão de outro? O BTG Pactual está sondando empresas que poderiam se associar à JBS na tentativa de tomar o controle da BRF, apurou o Pipeline. A abordagem seria conjunta porque, como a JBS não pode avançar sobre a concorrente sem uma severa restrição regulatória, teria que necessariamente promover um fatiamento do negócio.
O banco ainda não foi contratado para isso, não há um mandato formal com a JBS, mas começou a articular as possibilidades por categorias e marcas, disseram as fontes. “Neste momento, é um balão de ensaio”, afirmou uma delas.
O interesse da JBS em um contra-ataque à Marfrig na BRF foi revelado nesta sexta-feira pelo colunista Lauro Jardim, de O Globo. A notícia, divulgada de manhã, fez as ações da BRF dispararem, chegando a subir 14%. Fechou o pregão com alta de 3,9%, alcançando R$ 23,6 bilhões em valor de mercado.
Desenhar um eventual fatiamento seria uma forma de minar o fortalecimento da Marfrig na BRF. A companhia de Marcos Molina, que aplicou mais de US$ 1 bilhão para montar uma posição de 31,6% na dona da Sadia e Perdigão, declarou que vai ser um acionista passivo – mas pouca gente acredita que isso se sustente no longo prazo (no curto prazo pode até ser, já que a Marfrig está amarrada a determinadas condições com o J.P. Morgan, seu financiador na compra dos papéis)
Chamou atenção dos investidores que, nos questionamentos que fizeram à JBS, a companhia disse que não comentaria especulações — sem fazer questão de colocar fim a elas. “A JBS está tendo uma postura curiosa. Vários clientes ligaram lá e eles não negam, só dizem que não comentam. Dado que teve essa fumaça, eu não descartaria”, diz um analista de grande instituição financeira.
Para quem carrega BRF na carteira, o rumor veio bem a calhar — quem poderia imaginar que, depois de anos castigada na bolsa pelos próprios tropeços e pela perda do charme que carregou em seus áureos tempos, a dona da Sadia voltaria a ser uma noiva cobiçada. “Isso mostra quão estratégica é a BRF para quem quer ser relevante em processados”, apontou um analista. Para um gestor comprado em BRF, a qualidade do ativo justificaria uma disputa dessas.
Os planos, no entanto, parecem muito mirabolantes para saírem do papel, reforçam as fontes do setor e de bancos. Se quiser assumir o controle da BRF, a JBS teria de gastar os tubos em uma OPA, contrariando o histórico da família Batista, que avançou pagando barato por ativos de empresas em dificuldades.
Assumindo o prêmio de controle e a poison pill de 33,3% da BRF, a jogada poderia sair por R$ 40 bilhões, estimam analistas. Nessa hipótese, a JBS ficaria sem direito a voto na empresa até que o Cade apreciasse a transação.
Retalhar a BRF e até trocar a Seara, como cogitaram alguns gestores durante a tarde, soa despropositado para quem conhece a JBS e o tamanho do esforço e nível de investimento que a família Batista colocou na Seara (a companhia está recebendo bilhões em expansão para dobrar de tamanho até 2024, chegando a um faturamento de R$ 40 bilhões). Para um advogado especialista em antitruste, no entanto, trocar a Seara seria o mais simples dentro da complexidade do movimento.
“O jogo seria não deixar tudo cair na mão da Marfrig”, argumentou um observador privilegiado. Se tentasse um caminho semelhante ao da Marfrig na BRF, para pressionar a divisão de ativos, a JBS teria mais dificuldades uma vez que Molina enxugou parte da liquidez e fez o preço subir. Além disso, a tal posição passiva também encontraria obstáculos — a relação entre CSN e Usiminas já criou referência no Cade.
No Cade, a posição da JBS poderia acabar torpedeada não apenas pela concentração em frango, suínos e alimentos processados, a área de atuação da Seara, mas também pelo gigantesco negócio de carne bovina. Juntas, as marcas de BRF e JBS dominariam mais de 70% em categorias bem relevantes.
Um dos trunfos da Marfrig na compra das ações da BRF é justamente esse. Segunda maior indústria de carne bovina do país, a firma de Marcos Molina agregaria uma proteína que a BRF não possui, o que poderia ajudar em negociações comerciais. “Hoje, não é nada fácil concorrer com a JBS. Eles podem perder dinheiro no Brasil e compensar nos EUA”, disse um executivo do setor.
Se o eventual contra-ataque agitou a sexta-feira, boa parte das apostas — neste momento — é um placar para a Marfrig por WO. Mas como o avanço de Molina também era considerado improvável…
Fonte: Por Luiz Henrique Mendes e Maria Luíza Filgueiras, Pipeline Valor Econômico