Por Marcio Milan – Vice-presidente da ABRAS
Hoje o Código de Defesa do Consumidor (CDC) completa 35 anos. Celebrar a data é revisitar o contexto da sua criação, em 1990, e os avanços alcançados desde então. O CDC é um marco histórico na garantia de direitos e na construção de relações mais equilibradas e transparentes entre consumidores e fornecedores.
Para compreender a sua importância, é preciso lembrar o ambiente econômico e social que lhe deu origem. Os supermercadistas que atuavam nas décadas de 1980 hão de se recordar que o CDC nasceu em um Brasil de inflação descontrolada, consumidores fragilizados e um setor pressionado pela sociedade e pelo governo. A lei surgiu como resposta à necessidade de proteger o consumidor de práticas abusivas e dar maior previsibilidade às empresas que lidavam diariamente com milhões de brasileiros.
Esse cenário se explica pela dinâmica dos anos 1980, período em que o país conviveu com inflação galopante, que ultrapassou 200% em 1983. Planos econômicos sucessivos buscavam conter os preços, mas geravam distorções e insegurança no abastecimento. Nesse contexto, os supermercados estavam na linha de frente: comunicavam os aumentos à população e eram submetidos à fiscalização intensa, como no episódio dos “fiscais do Sarney” durante o Plano Cruzado (1986).
Diante de tantos desafios, o setor precisou se reinventar para preservar a confiança dos consumidores. Havia empenho em orientar o público: informávamos sobre sazonalidade, sugeríamos substituições e buscávamos controlar preços. A criatividade e o “jogo de cintura” tornaram-se instrumentos fundamentais para manter o consumo em meio à instabilidade.
É justamente nesse ambiente que o CDC ganha ainda mais relevância. Sua promulgação trouxe garantias fundamentais como o direito à informação clara, à proteção contra práticas abusivas, à reparação de danos e ao equilíbrio nas relações de consumo. Ao longo das décadas, sua aplicação vem sendo atualizada conforme as transformações da sociedade e do mercado. Ao incorporar temas como superendividamento e proteção de dados, o Código segue garantindo dignidade e cidadania aos consumidores em um ambiente cada vez mais digital.
Esse olhar para o presente reforça também a importância da atuação institucional. A ABRAS tem trabalhado para que a modernização das relações de consumo esteja refletida no Código. Entre os temas em debate está a dosimetria das multas, essencial para assegurar previsibilidade às empresas e proporcionalidade na aplicação das penalidades. Esse avanço contribui para fortalecer a confiança e promover relações de consumo mais justas e transparentes — objetivo que, há 35 anos, motivou a criação do próprio CDC e continua orientando sua aplicação.