Por Giseli Cabrini
Alemães, angolanos, argentinos, bolivianos, colombianos, cubanos, dominicanos, haitianos, marroquinos, paraguaios, peruanos, portugueses suíços, uruguaios, venezuelanos, entre outros. Essas são algumas das nacionalidades que fazem parte do quadro de colaboradores de redes supermercadistas do Brasil, como a Comercial Zaffari os grupos Pereira e TOP.
Para as varejistas, empregar imigrantes, incluindo refugiados, é uma oportunidade para promover o acolhimento dessas pessoas, bem como ampliar a diversidade cultural e a troca de experiências entre os próprios colaboradores e, até mesmo, com os clientes que têm o espanhol como língua de origem, em especial, os argentinos. Esse grupo, mais recentemente, tem intensificado suas compras no Brasil em virtude da valorização do peso frente ao real. Além disso, os estrangeiros representam uma alternativa diante da escassez de mão de obra enfrentada pelo varejo alimentar.
Já para os estrangeiros, trabalhar nas redes supermercadistas vem ao encontro de suas expectativas de acessar novas oportunidades de vida e de trabalho. E, como analisa o Grupo Pereira, “todos têm em comum a coragem de recomeçar – e a chance de construir uma nova história”. São trajetórias de superação que ganham ainda mais força neste 25 de junho, quando é comemorado no Brasil, o Dia do Imigrante.
Comercial Zaffari
Atualmente, a rede Comercial Zaffari mantém mais de 400 colaboradores estrangeiros e atua de forma ativa no recrutamento e acolhimento desses profissionais. A maior representatividade é de venezuelanos, com 324 colaboradores, o que corresponde a 73,8% do total de imigrantes contratados. Também integram o time pessoas de diversos países africanos, bem como haitianos, cubanos, africanos, uruguaios, argentinos, colombianos, entre outras nacionalidades. Isso reflete o compromisso da companhia com a diversidade e a inclusão no ambiente de trabalho.
Para transformar boas-vindas em pertencimento, a rede lançou o projeto Entre Culturas, braço do seu programa de diversidade, que tem como objetivo promover a equidade e igualdade de oportunidades para todos os colaboradores da Comercial Zaffari e Stok Center.
Coordenada pela psicóloga, Stéfani Girardello, a iniciativa aborda três eixos: cultura, linguagem e acolhimento. A ideia era trazer essa troca de experiência entre os colaboradores e desenvolver suas habilidades enquanto aprendiam sobre a cultura brasileira e de seus países de origem.
“Observando que nós tínhamos dentro da empresa um número bem significativo de imigrantes, a gente não podia deixar de trabalhar com o pilar étnico-racial. A permanência das pessoas imigrantes dentro do nosso negócio era bem significativa. Então existia uma oportunidade de a gente estar valorizando esse público, reconhecendo e acolhendo eles”, explica Stéfani.
Durante os encontros, que foram realizados em Passo Fundo (RS), os colaboradores tiveram a oportunidade de conversar sobre comunicação, costumes, assistência social e outros temas. A possibilidade da troca cultural foi um dos diferenciais para criar um ambiente mais integrado.
“É difícil chegar em outro país, uma língua diferente, uma cultura diferente. Apesar disso deu certo. E o projeto foi muito enriquecedor para a gente, porque conhecemos muita coisa nova”, relata o colaborador que trabalha na frente de caixa do Stok Center há seis meses, Norberto Romeno.
Os resultados do projeto têm sido promissores. Além da melhora no clima organizacional e na qualidade do atendimento, a iniciativa fortalece a posição da Comercial Zaffari como empresa referência em inclusão e diversidade no varejo gaúcho. Por isso, a empresa já planeja a expansão da iniciativa. “Já temos programado uma próxima turma para o segundo semestre do ano. Do mesmo formato, três módulos”, confirma Stéfani.
Grupo Pereira
No Grupo Pereira, a primeira contratação de estrangeiros aconteceu em 1989. Atualmente, a rede tem 1.402 estrangeiros em seu quadro de funcionários. A maioria é composta por venezuelanos (973), cubanos (197), haitianos (111) e argentinos (39). Completam esse montante pessoas de diferentes origens: da Bolívia, da Colômbia, do Peru, do Uruguai, do Paraguai, da República Dominicana, de Angola, do Marrocos e de Portugal, entre outros.
Eles representam 6,3% do total de colaboradores composto por 22 mil profissionais. Os estrangeiros atuam em lojas, centros de distribuição e unidades administrativas em diversos estados do País. Eles estão presentes em todas as bandeiras da companhia, incluindo Comper (supermercado) e Fort Atacadista (atacarejo) nos estados de: Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Rio Grande do Sul e no Distrito Federal. A praça de maior concentração é Santa Catarina.
Parte dos imigrantes que atuam na empresa são refugiados, que chegaram ao Brasil por meio de programas de acolhimento humanitário. Outros vieram por vontade própria. “Acreditamos que toda pessoa merece a chance de recomeçar com dignidade. Por isso, abrimos as portas para colaboradores estrangeiros e oferecemos oportunidades. Em troca, aprendemos muito com suas histórias de superação, força e esperança. Essa troca diária enriquece nossa cultura e nos fortalece como empresa”, afirma o diretor de Gente & Gestão do Grupo Pereira, Paulo Nogueira.
Segundo a gerente nacional de Gente & Gestão do Grupo Pereira, Gislaine Sandim, entre os pontos positivos está a possibilidade de compor um quadro diverso e inclusivo de colaboradores, no qual todos possam aprender com as histórias de vida e de superação dos imigrantes, bem como o enriquecimento da cultura da empresa.
Quanto aos desafios, o principal se relaciona à questão do idioma, isto é, integrar os colaboradores estrangeiros aos clientes brasileiros (gerar empatia) por conta da limitação da língua. Porém, para minimizar isso, a companhia tem iniciativas, como deixar a integração e o código de conduta traduzidos para o espanhol. E ações de treinamentos presenciais com pessoas do time de Recursos Humanos ou líderes que sejam fluentes e facilitem a aprendizagem.
Em contrapartida, a questão idiomática também pode ser um trunfo no caso dos colaboradores estrangeiros, cuja língua de origem é o espanhol. “Em Santa Catarina, principalmente no verão, recebemos muitos clientes turistas da América do Sul, grande parte vinda da Argentina, e no Centro-Oeste também recebemos visitantes do Paraguai devido à proximidade geográfica”.
Grupo TOP
Com atuação concentrada em território catarinense, o Grupo TOP iniciou a contratação de estrangeiros em 2011. Atualmente, a rede emprega 94 estrangeiros, sendo 4,69% do quadro total de colaboradores. As origens são variadas: da Venezuela, da Argentina, de Cuba, do Haiti, da Alemanha, do Paraguai e da Suíça.
“Acreditamos que a presença de colaboradores estrangeiros enriquece nosso ambiente de trabalho. Valorizamos a diversidade cultural e de experiências, bem como as variadas perspectivas que cada pessoa traz por conta disso. Essa pluralidade fortalece o aprendizado coletivo dentro da empresa e enriquece nossa cultura corporativa. Além disso, há também o fato de que os estrangeiros contribuem muito para o desenvolvimento econômico na medida nos ajudam a lidar com a escassez de mão de obra”, explica a diretora de Recursos Humanos do Grupo TOP, Graziela Schmoller.
Ela também pondera que o principal desafio está na comunicação, especialmente porque vários desses profissionais estão há pouco tempo no Brasil. Com isso, naturalmente, o domínio do idioma ainda está em desenvolvimento, gerando algumas dificuldades iniciais. “Mas a nossa cultura de apoio mútuo entre os colegas, algo que valorizamos muito, facilita o processo e diminui bastante as barreiras idiomáticas.”
No entanto, segundo Graziela, ter colaboradores cujo idioma nativo é o espanhol pode oferecer uma experiência de compra ainda mais agradável e fácil para clientes argentinos e outros hispânicos. “Em Santa Catarina, os argentinos têm movimentado bastante a economia, principalmente em cidades, como Florianópolis e Balneário Camboriú. Esse é outro benefício que a diversidade cultural, fruto da contratação de estrangeiros, traz para o nosso grupo.”
Embora a empresa não disponha, no momento, internamente de um programa de treinamento específico para o português, ela procura oferecer todo o suporte possível para garantir a adaptação. “Inclusive o nosso RH está sempre disponível para indicar escolas e dar orientações de como aprender o idioma até mesmo com os colegas de trabalho. Outro ponto importante é que temos o cuidado de, sempre que possível, integrar os novos colaboradores estrangeiros com colegas da mesma nacionalidade e que estão há mais tempo na empresa. Isso facilita a comunicação inicial, acelera o entendimento das rotinas da loja ou de quaisquer outras áreas e contribui para que se sintam mais acolhidos e confiantes no dia a dia.”
Personagens reais
Confira depoimentos de alguns colaboradores estrangeiros da Comercial Zaffari e dos grupos Pereira e TOP:
A venezuelana Lourdes Maria, que desembarcou sozinha no Rio Grande do Sul em busca de segurança e estabilidade para trazer sua família. Instalou-se primeiro em Ciríaco (RS), onde trabalhou e economizou até possibilitar a vinda dos dois filhos e marido. Em seguida, transferiu-se para Passo Fundo (RS) em busca de melhores oportunidades e, logo ao chegar, conquistou uma vaga no Stok Center, bandeira de atacarejo da Comercial Zaffari. Dessa jornada já se passaram três anos como colaboradora da rede de supermercados. Nesse período, Lourdes avançou no domínio do idioma, superou o choque cultural e foi promovida quatro vezes, assumindo seu primeiro cargo de liderança na posição líder de frente de caixa. “Quando cheguei morava perto de uma das lojas do Stok Center, então decidi ver se conseguiria algo. Entrei no site, fiz o meu cadastro e no mesmo dia recebi a chamada para uma entrevista. Eu não conseguia me comunicar muito bem, mas mesmo assim eu recebi a oportunidade”, relata Lourdes.

Giskar Ramon Hernandez e Yenifer Pierina Mosquera, funcionários do Grupo Pereira. Foto: Divulgação/Grupo Pereira
“Tenho saudade da Venezuela, mas graças a Deus o Brasil abriu as portas para mim e para minha família”, conta Yenifer Pierina Mosquera. A jornada dela começou por Roraima, seguiu por Manaus (AM) e depois pelo município de Parobé, no Rio Grande do Sul. Há dois anos, ela vive e trabalha em Novo Hamburgo (RS). Yenefer é atendente de cafeteria no Fort Atacadista da cidade. Ela lembra que os primeiros tempos não foram fáceis, especialmente por não falar o idioma. “Foi difícil, mas minha filha está estudando, e nós seguimos aprendendo cada vez mais o português.”
O venezuelano Giskar Ramon Hernandez, de 39 anos, deixou a cidade de Porlamar em busca de uma vida melhor no Brasil. Está no País há apenas 11 meses, mas já construiu uma nova história. “Minha vida era muito diferente antes de vir para o Brasil, em todos os sentidos, familiar, econômico e profissional”, conta. No Rio Grande do Sul, mais do que trabalho, também no Fort Atacadista, Giskar encontrou amor, formou uma família com sua companheira Rosa Aurora, que também é venezuelana, e celebrou recentemente o nascimento da filha, Lyanna Arleth, que tem apenas um mês. “Ela me falava muito sobre as oportunidades, a qualidade de vida e as pessoas daqui. E eu gostei. Agora estamos juntos, conhecendo cada vez mais a cultura gaúcha. Muita gente humilde e maravilhosa cruzou nosso caminho.”
A haitiana Nadege Pierre, que trabalha na área de frutas, legumes e verduras (FLV), do Grupo TOP, conta que há oito anos vive no Brasil. No país de origem, ela trabalhava na área de restaurantes. Segundo Nadege, o trabalho atual é importante para ajudar no sustento da família. E, como consumidora, ela enxerga oportunidades de aprimoramento na seção onde atua.
Também parte do quadro de colaboradores do Grupo TOP, a venezuelana Yohannis del Carmen Arriojas Arias está morando no Brasil há dois anos. Embora não tenha trabalhado anteriormente em supermercados em seu país de origem, ela descarta que existam muitas diferenças entre o varejo alimentar daqui e de lá. Ela, que é operadora de caixa, também destaca a ajuda entre as pessoas, mas enxerga pontos de melhoria pessoal voltados ao atendimento. Como cliente, ela acha importante que as lojas facilitem o posicionamento dos produtos no sentido de encontrar aquilo que ela procura na hora de ir às compras de forma descomplicada.
Nos vídeos, a seguir, mais depoimentos de colaboradores estrangeiros do Grupo Pereira, que participaram do programa de comunicação interna da empresa, o “Viva suas Raízes”. Nos vídeos, eles compartilham sua trajetória pessoal e dentro da rede, além de aspectos da sua cultura de origem.