Em 25 anos, o Brasil deixará de ser uma “nação jovem”. Projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que, até 2050, quatro em cada dez brasileiros estarão na meia-idade. A velha pirâmide etária vira um retângulo – e o varejo que não enxergar esse contorno corre o risco de ficar para trás.
Para a pesquisadora Roberta Campos, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), o mercado já entrou na era do consumidor multigeracional. Quem combinar dados, empatia e inovação vai transformar o envelhecimento da população na maior vantagem competitiva das próximas décadas; quem ignorar esse movimento verá oportunidades – e receita – escorrerem pelos dedos.
Na busca pela expansão sustentável dos negócios, empresas de varejo e serviços estão diante de um cenário demográfico com potencial para abrir valiosas oportunidades. Será quando cerca de 40% da população brasileira terá meia-idade, superando a parcela antes ocupada por jovens, crianças e adolescentes.
Especialista em comportamento do consumidor, a docente da ESPM reforça a importância de se discutir o assunto. “Haverá uma mudança extrema da distribuição da população até 2050, com uma diminuição da base do gráfico que, há cem anos, tinha o formato de pirâmide, e que vai passar a se assemelhar a uma coluna com pouca variação na base ao topo”, descreve Roberta.
Cinco gerações
A transformação demográfica pela qual o País passa – com idosos mais longevos e saudáveis – permite que, pela primeira vez na história, cinco gerações de pessoas coexistam e consumam simultaneamente – os baby boomers (nascidos entre 1947 e 1963), a geração X (de 1964 a 1983), os millennials (de 1984 a 1995), a geração Z (1995 a 2009) e a geração Alfa (a partir de 2010).
Cada uma dessas camadas da sociedade tem necessidades, gostos, desejos, exigências e fragilidades próprias. Isso vai exigir produtos e serviços cada vez mais personalizados. “Trata-se de um desafio enorme para empresas de qualquer porte. Mas creio que, quanto menor for o negócio, maiores sãos as facilidades de conseguir personalização do atendimento”, diz Marília Freitas, consultora de negócios do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae-SP).
Marília utiliza como exemplo um restaurante de bairro para explicar como empresas menores tendem a ser mais dinâmicas. “O proprietário tem contato direto com a freguesia e pode se ajustar quase que instantaneamente às necessidades do cliente. E, assim, esse gestor pode oferecer um serviço customizado e individual a cada geração”, afirma a consultora do Sebrae-SP, ressaltando que empresas maiores sofrem com a lentidão de processos operacionais complexos.
‘Multietário’
De acordo com a professora e pesquisadora da ESPM, negócios promissores precisam oferecer serviços multigeracionais. “Saber atender esse mercado multietário vai ser cada vez mais necessário, porque, para empresários e gestores construírem uma maioria de consumidores, um mercado consumidor amplo, eles terão de se preocupar em abranger várias idades”, analisa Roberta.
Na visão da consultora do Sebrae, a universalização da tecnologia vai permitir que o atendimento ao cliente seja guiado pelas preferências armazenadas nos bancos de dados das empresas. Dessa maneira, será normal a pessoa ser reconhecida quando entrar nos estabelecimentos, assim como já ocorre em hospitais, um dos setores com os mais avançados sistemas de rastreabilidade.
“Com o avanço das ferramentas de inteligência artificial a tendência é de maior refino da personalização nos setores de varejo e de serviços. O grande volume de dados gerados vai permitir a empresários e gestores uma melhor percepção dos desejos da sua clientela”, avalia Marília.
Mas, se por um lado o uso da ciência de dados pode aproximar empresas dos consumidores, a falta de uma gestão adequada dos recursos digitais pode representar um risco em potencial aos negócios. A consultora do Sebrae-SP alerta para a necessidade de monitoramento constante e estratégias de gestão de crise.
“A popularização do uso das redes sociais requer uma atenção cuidadosa e profissional das plataformas digitais. Reputações construídas ao longo de anos podem derreter rapidamente após interações negativas”, acrescenta Marília, citando casos em que a própria empresa põe tudo a perder. “Uma resposta inadequada a um cliente pode gerar situações irreversíveis. É preciso estar preparado”, destaca.
Conforme a pesquisa Deloitte Global’s 2025 Gen Z and Millennials Survey, que ouviu 23.482 jovens dessas duas gerações em 44 países, consumidores das gerações Z e millennials serão 74% da mão de obra global, com boa parte do poder de compra até 2030.
Sustentabilidade em evidência
A pedido do Estadão, a consultoria Deloitte forneceu um recorte brasileiro do levantamento global. Os dados apontam que, no País, os jovens demonstram maior preocupação ambiental do que a média global. A crise climática, por exemplo, é um dos motivos de maior preocupação para 24% da geração Z e 25% dos millennials.
Entre os entrevistados no Brasil, 81% da geração Z e 79% dos millennials admitem que pensar sobre os impactos ambientais das ações humanas causa preocupação e ansiedade. Esse público consumidor também demonstra disposição e ansiedade em contribuir com medidas de proteção ao ambiente e de ações capazes de reverter danos já causados.
Esses dados refletem no comportamento desses consumidores. No Brasil, 72% da geração Z e 74% dos millennials admitiram aos entrevistadores que estariam dispostos a pagar mais para adquirir produtos ou serviços sustentáveis.
Fonte: Estadão